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quinta-feira, 17 abril 2025
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Lobby e Democracia

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*Márcio Coimbra

Ao ler as notícias do dia, me deparei com a seguinte manchete: “Lobista cobrou 20% para liberar emendas de empresários investigados, diz PF”. Ao abrir a matéria, pude perceber que não se tratava de um lobista, mas de alguém que exercia, sem cerimônias, a prática de tráfico de influência.

Me senti aliviado. Afinal de contas, nada mais longe do exercício diário da vida de um lobista do que a ação denunciada pela matéria. Antes de qualquer coisa, é preciso deixar algo muito claro: lobby não é tráfico de influência. Pelo contrário, são conceitos antagônicos. Mais do que isso, o lobby somente existe onde há um sistema democrático e transparente, enquanto o tráfico de influência é uma prática comum em regimes autocráticos e autoritários, onde existe concentração arbitrária de poder.

Nosso país, uma jovem democracia, somente foi apresentado ao lobby em tempos recentes e ainda possui dificuldade em entender sua legitimidade. O lobby é uma prática tão antiga quanto a democracia, pois, se estamos diante de um regime com plenas liberdades, talvez a mais importante delas seja aquela que garante à sociedade o direito de ser ouvida pelos seus representantes. Ao isolar-se e rejeitar a necessidade de ouvir, um governo torna-se autoritário. Ao fechar as portas para os pleitos dos eleitores, um parlamento perde legitimidade. Ao deixar de ouvir as partes, um juiz se torna despótico. Limitar o direito ao lobby é limitar o direito ao exercício mais básico de cidadania em uma democracia.

O termo “lobby” nasceu nos Estados Unidos, país que moldou o conceito moderno de democracia como conhecemos. No início de sua república, os parlamentares passavam longos períodos em Washington, hospedados no hotel Willard, localizado entre o Congresso e a Casa Branca. No lobby do hotel, era comum encontrar representantes do setor privado à espera dos parlamentares, para que estes pudessem ouvir sobre o impacto das leis que estavam por analisar. Dessa atividade surgiu o termo “lobby”.

Os lobistas tornaram-se elemento central do processo legislativo e pilar essencial da democracia, uma vez que se tornou fundamental ouvir os setores da sociedade afetados pelas leis que eram debatidas no Capitólio. A prática cresceu em importância e relevância na medida em que aperfeiçoava diplomas legais mediante diálogo direto com a sociedade. As leis passaram a ser debatidas ouvindo a realidade do cidadão, contribuindo para que a legislação ajudasse o país a prosperar.

No Brasil, o termo passou a fazer parte de nosso cotidiano durante o mais recente período autoritário, quando não havia eleições e o parlamento permanecia fechado. Mais do que isso, passou a designar aqueles que conseguiam arrancar favores e políticas favoráveis do regime militar — uma clara situação que configurava tráfico de influência.

Com a redemocratização e o nascimento da prática de lobby como instrumento legítimo da sociedade, o termo, usado de forma equivocada para designar tráfico de influência, foi internalizado erroneamente em nossa língua. Para remediar essa confusão, o primeiro grande passo seria ver nosso Congresso Nacional aprovar a lei que regulamenta essa atividade. Uma ação tardia, com mais de dois séculos de atraso, porém relevante e necessária para a introdução de mecanismos éticos e transparentes para essa atividade, que é um dos pilares da democracia.

*Márcio Coimbra é CEO da Casa Política e presidente-executivo do Instituto Monitor da Democracia. Conselheiro da Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (Abrig). Cientista político, mestre em Ação Política pela Universidad Rey Juan Carlos (2007). Ex-diretor da Apex-Brasil e do Senado Federal.

**Este artigo expressa a visão do autor. O Portal não se responsabiliza pelas informações aqui apresentadas.

 

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